Escolas Vivas

De espaços escolares a Centros Urbanos Multifuncionais de Lisboa

Manuel Banza

Manuel Banza

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O potencial das escolas vai além do ensino: podem tornar-se espaços de convívio, apoio comunitário e resposta aos desafios urbanos.

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Ilha de calor ao entardecer
1.5 - 2.0
2.0 - 2.5
2.5 - 3.0
3.0 - 3.5
3.5 - 4.0
4.0 - 4.5
Lisboa é a sétima cidade da Europa mais exposta ao calor, um problema que tem agravado o número de mortes relacionadas com as ondas de calor e acentuado as desigualdades sociais. O efeito de ilha de calor, provocado pela urbanização densa e pela escassez de vegetação, afeta desproporcionalmente os mais vulneráveis, como idosos e crianças. Portugal é ainda o segundo pior país da União Europeia em termos de capacidade das pessoas para arrefecerem as suas habitações.
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m2 de área verde per capita por freguesia
0 - 5
5 - 10
> 10
Lisboa carece de espaços públicos que fomentem o convívio e o sentimento de pertença. Em 16 dos 24 freguesias, a área verde por habitante é inferior aos 10 m² recomendados pela OMS, limite essencial para a saúde física e mental. Além de promoverem lazer e socialização, os espaços verdes mitigam a poluição e o calor urbano, sendo fundamentais para cidades mais inclusivas e resilientes face às mudanças climáticas.
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Gentrificação
Segundo a Confederação Portuguesa de Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto, mais de 20% dos coletivos desapareceram em Lisboa nos últimos 24 anos, pressionados pela gentrificação, o turismo e o aumento das rendas, que dificultam a manutenção ou obtenção de novos espaços.
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Mensagem Sirigaita
Coletivos como a Sirigaita e a Zona Franca dos Anjos que já receberem ordem de despejo resistem, promovendo eventos culturais e ações políticas.

Se não há espaço para construção...

Como podemos criar melhores espaços públicos, promover a coesão social e combater as alterações climáticas?

Além disso, que tipo de operações urbanas em Lisboa podem ser reconfiguradas e otimizadas para aumentar e melhorar o espaço público disponível?

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Proposta:

Aproveitar os espaços existentes como escolas, abri-los à população já que se encontram fechadas quase 50% do tempo.

Espaços Escolas
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Tipo de escolas
Público
Privado dependente do estado
As escolas são equipamentos públicos que, contabilizando fins de semana, férias escolares e horários pós-laborais, encontram-se fechados quase metade do ano. Durante esses períodos, estes espaços podem ser utilizados para acolher eventos culturais, reuniões de bairro, mas também criar refúgios climáticos em tempos de calor extremo, aproveitando assim para melhorar os recreios escolares, onde as sombras e contacto com a natureza são frequentemente escassos.
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A implementação desta solução permite otimizar infraestruturas já existentes, melhorando simultaneamente a vida comunitária e ambiental de Lisboa. No entanto é importante referir que apenas serve como medida imediata e urgente, visto ser necessário pensar em garantir que as associações em Lisboa consigam ter e permanecer no seu próprio espaço e ter uma sustentabilidade financeira.
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Distância a pé da escola
5 min
10 min
15 min
Com quase 200 escolas públicas ou com apoio público (IPSS) distribuídas por Lisboa, aproximadamente 38% da população da cidade vive a menos de 5 minutos a pé de pelo menos uma escola, enquanto 89% reside a 10 minutos de distância. Essa distribuição demonstra a acessibilidade que estas infraestruturas oferecem à comunidade local e reforça o potencial desta iniciativa em aproveitar essas localizações para abranger praticamente toda a população num espaço de até 15 minutos a pé.
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Fases Temporais
Criando um novo programa municipal intitulado "Escolas Vivas", podemos transformar os pátios e infraestruturas escolares em centros comunitários multifuncionais. Esta solução tem como base a intermitência no uso do espaço, já que as escolas estão inativas durante grande parte do dia. Este conceito insere-se num novo paradigma de concepção do que é um espaço público quando introduzimos a variável do tempo.
Podemos propor três possíveis blocos de implementação do projeto. A escola é uma infraestrutura que permanece fechada metade do ano, incluindo férias, fins de semana e feriados. Em média, tem o potencial de estar aberta até mais 9 horas por dia, estando fechada por volta de 63 dias ao ano por ser fim de semana e feriados, além de permanecer encerrada até 78 dias consecutivos nas férias de verão.
Tipos de Uso
Com esta nova dimensão, vários são os espaços que podemos repensar como espaço público num certo período e horário do dia, sendo as escolas um desses exemplos, mas também as universidades ou museus, entre outros.

Esta utilização dos espaços pode ocorrer de várias formas práticas e imediatas.
Cantinas comunitárias: Os refeitórios escolares, que estão fechados fora do horário escolar, podem ser transformados em cantinas comunitárias, especialmente à noite. Geridas por organizações locais, essas cantinas poderiam oferecer refeições a preços justos. Este modelo de gestão cooperativa fortalece a economia solidária, promove o apoio mútuo e ajuda a combater a exclusão social, e pode ainda ajudar a promover hábitos de alimentação mais saudáveis.
Utilização comunitária das cozinhas escolares: As cozinhas das escolas podem ser transformadas em espaços produtivos, permitindo que cooperativas e pequenos produtores locais as utilizem fora do horário escolar. Nas cooperativas de consumo, como é o caso da Cooperativa Integral Rizoma em Lisboa, alguns dos produtos são produzidos por prossumidores – cooperantes que, além de consumidores, são também pequenos produtores. Para esses prossumidores, a utilização das cozinhas escolares oferece uma oportunidade única de testar os seus negócios e produtos sem os elevados custos iniciais associados ao aluguer de espaços com cozinhas aptas para uma produção comercial. Ao oferecer acesso a cozinhas industriais, esta solução apoia o desenvolvimento de pequenos negócios locais, promovendo a produção sustentável, local e de baixo impacto ecológico, ao mesmo tempo que fomenta a economia cooperativa e solidária.
Piscinas comunitárias desmontáveis: Durante o Verão, as escolas podem disponibilizar pátios para a instalação de piscinas desmontáveis, geridas pela própria comunidade. Esta solução poderia ajudar crianças cujas famílias não têm capacidade de as levar regularmente à praia ou piscinas de lazer, passando assim a ter um espaço seguro para o combate ao calor. Esta auto-organização já acontece em alguns bairros de Lisboa, onde vizinhos se juntam para comprar e montar piscinas em lugares de estacionamento para os seus filhos se poderem refrescar em dias quentes. A instalação de piscinas em espaço escolar constitui uma oportunidade de pensá-las numa versão melhorada, com sistemas de renovação de água que evitem o desperdício e garantam condições de saúde adequadas, bem como garantir mais segurança para as crianças e adultos num ambiente mais controlado.
Piscinas Comunitárias
Manuel Banza
Hortas comunitárias: As escolas podem ceder espaços para hortas comunitárias, geridas por moradores e organizações locais. Estas hortas promovem a sustentabilidade, permitindo que os residentes cultivem os seus alimentos, enquanto fortalecem a educação ambiental e o convívio intergeracional. Podem também surgir projetos para vender os produtos em cooperativas de consumo locais, garantindo um consumo com menor pegada ecológica, tal como a cooperativa Rizoma está a fazer na escola Gil Vicente.
Cedência de salas para associações e cooperativas: Um dos aspetos essenciais desta proposta é a cedência de salas de aula e auditórios para reuniões, assembleias e eventos organizados por associações e cooperativas que, devido ao aumento dos preços de arrendamento em Lisboa, têm cada vez menos capacidade para manter um espaço próprio. A disponibilização de espaços nas escolas permite-lhes continuar a desempenhar o seu papel fundamental sem custos proibitivos, garantindo a continuidade de atividades culturais, sociais e de apoio à comunidade. Além disso, as infraestruturas escolares podem ser partilhadas com organizações desportivas e culturais, permitindo o acesso a novas modalidades e atividades recreativas, como aulas e ensaios de teatro, música e dança. A criação de protocolos de cedência pode garantir que, em troca do espaço, algumas destas atividades sejam gratuitas para pessoas com menos capacidade financeira, promovendo a inclusão.
Assembleias de cidadãos: As infraestruturas escolares podem ser utilizadas para assembleias de cidadãos, onde a comunidade discute e toma decisões coletivas sobre o bairro. Estas assembleias são essenciais para fortalecer a democracia participativa e garantir que as decisões refletem as necessidades locais, bem como para criar um sentimento de bairrismo e de apoio mútuo entre os vizinhos.

Da ideia à ação: Como tornar as Escolas Vivas uma realidade?

Implementação Piloto: Para garantir uma implementação eficaz e sustentável do programa "Escolas Vivas", poderíamos começar por selecionar uma das 24 freguesias de Lisboa como projeto piloto, que permitirá refinar o modelo antes de o expandir para outras áreas da cidade. Essa freguesia poderia ser escolhida, por exemplo, com base na sua densidade populacional e na escassez de infraestruturas comunitárias, culturais e desportivas. Podendo começar por exemplo pela freguesia de Arroios, que conta com 6 potenciais escolas.
Piloto Arroios
Apesar do potencial, este programa enfrenta desafios como a falta de experiência administrativa local. Com a descentralização em curso — com municípios assumindo funções do Ministério da Educação — é o momento ideal para avançar. Recomenda-se capacitar os atores locais, definir a governança, criar processos claros de decisão e de monitorização contínua. Promover a colaboração entre cooperativas e escolas para evitar sobrecarga dos serviços municipais.

Cidades europeias já implementaram com sucesso ideias semelhantes. É o caso de Barcelona que abriu no Verão de 2024 mais 38 pátios escolares como refúgios climáticos e tem mais de 200 escolas que foram alvo de melhoria e aumento do espaço pedonal nas ruas em frente às escolas.
Em vez de investirmos em novas infraestruturas, estaríamos a reutilizar espaços existentes, otimizando recursos. A proposta das "Escolas Vivas" não parte do zero, mas sim de práticas que já existem, como a utilização das escolas para eleições políticas, com as quais a maioria de nós já está familiarizada, ou para atividades desportivas pontuais, como treinos em pavilhões escolares. O objetivo é potenciar e expandir essas apropriações, demonstrando que é possível maximizar o uso das infraestruturas. O impacto positivo não se limita ao ambiente: a criação de espaços de convívio pode reforçar a coesão social, reduzir as tensões urbanas e, a longo prazo, até combater fenómenos como a gentrificação, mantendo as associações locais ativas e integradas nos seus bairros. Com a participação ativa dos cidadãos na definição do que cada escola pode dar ao seu bairro, podemos criar uma cidade mais verde, inclusiva e resiliente. Da gentrificação ao efeito de ilha de calor, Lisboa vê-se numa encruzilhada, mas esta é a oportunidade de dar um passo firme em frente, em direção a um futuro mais sustentável e comum.
Este trabalho é um resumo da minha tese de mestrado em Urbanismo Próximo no IAAC - Institute for Advanced Architecture of Catalonia, defendida em Julho de 2024. Se tens interesse em saber mais sobre este projeto, podes consultar a tese final em PDF na imagem abaixo: